Quem sou eu

Minha foto
Amante das mágicas de Aladim.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

A IMPORTÂNCIA DO SILÊNCIO NOS (TODOS) ESPAÇOS SAGRADOS



(imagem do google)


Existe uma música chamada The Sound of Silence – O Som do Silêncio (Simon & Garfunkel) que só a melodia já nos eleva e enleva. Traduzindo um pequeno trecho temos: pessoas conversando sem estar dizendo / pessoas ouvindo sem estar escutando... Será que normalmente tagarelamos só pelo hábito de falar, falar e falar? É preciso que pensemos a respeito.

No filme Nosso Lar há um momento em que Lísias oferece água fluidificada para um paciente, em tratamento no hospital na colônia espiritual, que não parava de falar - sem dizer muita coisa, mais perguntando do que querendo ouvir. Lísias  pede-lhe que permaneça com a boca bem cheia de água, sem engulir, durante muito tempo; fazia parte do tratamento e da cura. Na verdade enquanto não podia falar, refletia. É preciso que pensemos a respeito.

Jesus, quando queria falar com o Pai, recolhia-se, fugia da falação humana, e assim se processava, livre e serenamente, a verdadeira intimidade entre Pai e Filho. É preciso que pensemos a respeito.

No livro Comer, Rezar e Amar a personagem, enquanto estava na Índia, em busca de si mesma, entende que rezar é falar com Deus e meditar (e isso se faz em silêncio) é ouvir o que Deus tem a nos dizer. É preciso que pensemos a respeito.

Há uma historinha, bastante conhecida, sobre o patrão que manda o empregado ir à feira comprar a melhor iguaria a fim de oferecer um jantar a convidados da melhor qualidade. O empregado traz língua. No dia seguinte o jantar seria para convidados da pior qualidade e o empregado traz também língua. Podemos deduzir a moral da história? É preciso que pensemos a respeito.

Existem muitos  exemplos sobre o valor do silêncio, principalmente quando estamos numa casa de oração porque é quando acontece a sintonia mental com a luz divina, quando nosso guia ou anjo da guarda coxixa em nossos ouvidos, lembrando-nos sobre a nossa essência e da necessidade de recebermos os comunicados necessários para a reparação dos nossos equívocos e até soluções para nossos problemas.

É por isso, e muito mais, que se diz que o silêncio é uma prece. Portanto, quando estivermos num local onde a oração conjunta é muito importante para potencializar as energias vindas do céu para que a providência divina opere em nós, aquietemos a mente, silenciemos a boca para que a nossa prece emane do coração e seja ouvida pelo Mestre. Lembremos disso da próxima vez em que adentrarmos centros de orações ou em espaços que os representem.

O poeta Caio Fernando Abreu, muito sabidamente, escreveu que o silêncio responde até mesmo aquilo que não foi perguntado. Então, entendemos que os nossos ouvidos e olhos vivem cheios dos ruídos da modernidade que nos impedem de ver e ouvir o que é realmente essencial: o sagrado que há nos lugares, nas coisas e nas pessoas que nos rodeiam. Se queisermos ter olhos de ver e ouvidos de ouvir, devemos exercitar a primeira condição para o contato com o sagrado, ou seja, silenciar para sentir e adquirir a lucidez de estarmos na terra sagrada interior onde ocorre o diálogo intraduzível da nossa alma com o Divino que está em todos os lugares, misturado com todas as coisas pois que é onipresente. Por isso que no Paraíso bíblico não havia templos porque tudo estava presente em tudo. Hoje entendemos como templo apenas uma construção física onde passamos alguns momentos para pedir e receber. Nem lembramos que o nosso próprio corpo é o templo onde o Senhor da vida habita. A nossa mente a fábrica dos milagres.

Em verdade, quando queremos reentrar ou reencontrar o Paraíso, basta fazermos a conexão com o momento presente e, em silêncio, caminhar pelos jardins em estado de reverência e gratidão. É nessa hora que recebemos as iluminações. Este é o motivo de os hindus fazerem mouna – votos de silêncio - por um período, pequeno que seja, a fim de poder olhar, ver, ouvir(-se) e sentir. Os yogues, os filósofos e os religiosos privilegiam a meditação e o silenciar como atos de escuta e reverência à Criação.

Numa palestra do psicanalista Luis Fernando Rodrigues ouvi uma definição sobre o que é Sagrado, Profano e Experiência com o Divino que serviu para minhas reflexões: Sagrado é tudo aquilo que escapa da rotina; tudo aquilo que não é senso comum; tudo aquilo que não se repete no cotidiano. É uma experiência com algo que nos leva aos nossos limites. Ao contrário de Profano, que é repetitivo, cotidiano, aquilo que está esvaziado de experiência – esvaziado do sentido mágico; a Experiência destituída do impacto emocional. Deus, no entanto, é uma Experiência indecifrável. Para entendê-Lo é preciso contemplar que é olhar sem poder conceituar.

Creio que precisamos repensar a importância do silêncio, principalmente nos locais aos quais atribuímos o sentimento da sacralidade. Finalizo com o trecho de mais uma historinha que me contaram há muito, muito tempo:

Havia certa vez um homem que dizia nome de Deus. Quando o coração lhe doía por uma criança que chorava, ou um pobre que mendigava, ele andava até a floresta, acendia o fogo, entoava canções e dizia as palavras. E Deus o ouvia... O tempo passou. Voltou à mesma floresta. Mas não carregava fogo nas mãos. Só lhe restou cantar as canções e dizer as palavras. E Deus o atendeu ainda assim. Um tempo mais longo se foi. Sem fogo nas mãos, sem força nas pernas, não alcançou a floresta. Mas do seu quarto saíram as mesmas canções e as mesmas palavras. E Deus lhe disse que sim. Chegou a velhice. Nem floresta nem fogo ou canções. Restaram as palavra. E o mesmo milagre ocorreu. Por fim, sem fogo ou floresta, sem canções ou palavras. Só mesmo o infinito desejo e o silêncio: e Deus atendeu...

Paz & Luz!

6 comentários:

Anônimo disse...

Amiga,

Muito sábio este comentário, parabéns!

Beijos



Leidi Peres

leidiperes2@yahoo.com.br

Anônimo disse...

Cara Neuza,

Sua visão sobre o silêncio orienta-nos em nossa caminhada. As escolas pitagóricas em Grécia antiga também valorizavam em demasia o silêncio, só que eles eram mais rigorosos ainda, o candidato ou aluno deveria permanecer por uns quatro anos em silêncio e só depois manifestar seus pensamentos ou falar. Isto mostra que primeiro é preciso ouvir para depois falar. Aquele que não sabe primeiro tem que aprender. Ainda assim, nenhum ser humano é tão pequeno que não possa emitir seu pensamento através de palavras, e quando queremos nós auxiliamos com nosso exemplo e por que não com uma palavra amiga. O eclesiastes menciona que há tempo de tudo na terra, há tempo de plantar e de colher, há tempo de apagar e acender, e há tempo de ouvir e falar. O justo equilíbrio é a medida.

Abraço,

Max
11 de junho de 2012 07:55

Anônimo disse...

Muito obrigada querida amiga por compartilhar sobre o silêncio conosco, que ele se propague!

Fique com Deus.


Beijos
Rita Peterle

Anônimo disse...

Neuzamaria,

muito bom... só discordo do psicanalista. somente um pensamento dualista separa o que é sagrado e profano. vc é baiana e entende bem isso. a experiência - ser atravessada , é irrepetível; a palavra traz o sentido de travessia e ainda de perigo uma vez que n se é atravessada impunemente. assim, a experiência é o lugar de encontro com o divino. aqui em salvador com a mesma fé se louva Oxalá e Senhor do Bonfim. Dançamos e cantamos para celebrar esse encontro. Essa separação entre o bem e o mal vem do pensamento moderno que concebe a vida de modo maniqueísta e binário. Aliás, a igreja se apropria e transforma em bem e mal, a ciência em certo e errado, o capital em rico e pobre. Então, esse lugar da experiência como limiar é o lugar do que é Um: sagrado/profano, rico/pobre, ;feio/belo, bem/mal... não existem categorias só fluxo e silêncio.
beijinho

p.s. vc sabe que existe um dia do silêncio? n lembro o dia. já aconteceu este ano...

Ana Rita
Em 7 de junho de 2012 17:55

Anônimo disse...

Irmã,

Essa última parte,parágrafo onde você conta uma historinha que ouviu há muito tempo, reflete muito bem de forma poética a passagem de minha mãe aqui na Terra. Infelizmente, minha mãe Maria José Queiroz Kerner, não conseguiu aceitar as coisas da idade: as dores nas pernas, por exemplo. Enquanto estava entre nós pediu a DEUS muitas bençãos e foi atendida através do fogo para lutar e iluminar os nossos caminhos: canções para desabafar e espantar as dores d'alma ... e palavras para confortar e aconselhar cada cria. Um dia, sem forças, sem fogo, canções e palavras, silenciou ... e DEUS, com toda sua misericórdia, concedeu-lhe o último pedido: o sono profundo.

Silvia Kerner
07/06/2012

Neuzamaria Kerner disse...

Silvia, irmã.
Entendo o seu comentário como um desabafo, uma forma de aliviar a dor que ainda sente pela nossa recente "perda". Quando você fala da canção que o homem entoava, lembro do meu amigo e colega, Bartolomeu Campos - postagem anterior a esta - que dizia que quando a mãe dele cantava ele sabia que estava doendo muito (por causa da doença)... isso o entristecia e justifica, de certa forma, a escolha de ser escritor para libertar as palavras aprisionadas nas suas dores da infância. Naza também cantava...

Mas tentemos ver pelo lado positivo. Ela continua cantando, porém não mais por tristeza. Canta porque juntou-se ao coro dos anjos do céu. O canto da gratidão e do júbilo.
Paz & luz, querida.