Quem sou eu

Minha foto
Amante das mágicas de Aladim.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

CARTA PARA JUSTINE

Cara Justine.

Quinze de setembro de dois mil e onze.

Há vários dias tento lhe escrever, mas sempre adio sem saber exatamente o motivo da postergação. Talvez eu até saiba... O inconsciente, no entanto, é extraordinariamente protetor em certas situações. Tenho quase certeza de que você sabe do que falo. É possível. Tudo é possível neste mundo nosso de possibilidades. Então, amiga, se é que posso tratá-la assim, fiz alguns malabarismos mentais para driblar o meu inconsciente a fim de deixar emergir pensamentos teimosos que dançavam no meu palco interior e que lutavam bastante para continuarem invisíveis e indecifráveis até o momento em que lhe vi.

Em verdade, esses pensamentos são como seres ou entidades ou sentimentos esdrúxulos que habitam nossas mais abissais regiões. Como nos dão trabalho! O consolo é que eles não estão apenas comigo e com você, mas com todos os seres viventes e pensantes  que desde que “encarnam” já vêm com a carga de raiva, tristeza e medo e suas polaridades como se fosse uma maldição passada de geração em geração.

Pois bem, acompanhei seus últimos e impressionantes passos naqueles dias da transformação compulsória – digamos assim, eufemisticamente. Confesso que no primeiro momento da sua aparição não lhe entendi muito bem. Você deveria estar feliz, afinal estava casando com um homem bom e bonito e que parecia realmente lhe amar. Por que você o rejeitou? Será porque você quis poupar-se ou poupá-lo de dores? Ou  não o amava o bastante para juntos enfrentarem o que estaria por vir? Seu casamento deu uma espécie de prazer – de hora última - à sua irmã e ao seu cunhado que não economizaram dinheiro nem trabalho para que sua festa fosse a mais linda. Perfeita. Sua mãe, pra variar, transbordava o amargor de sempre; seu pai, amoroso e generoso, mas na dele... provavelmente nunca quis se comprometer com a vida. Talvez aí esteja a explicação do comportamento de sua mãe. Os outros parentes, como todos. Sabe, o seu chefe - pobre coitado -, mereceu os desaforos que você corajosamente despejou sobre ele, um carcará hipócrita, fazedor de dinheiro e que nunca se preocupou com as suas questões existenciais – nem com as de ninguém. Nem nunca atentou para os motivos da irreverência contida nas suas peças publicitárias. Creio que naquela hora você vingou todos os desrespeitados nas empresas sem precisar buscar apoio nos famigerados sindicatos de trabalhadores.

Depois da festa pude voltar a me concentrar somente em você, inclusive lembrando-me da cópula – tenho que dizer esse nome sem graça – com o cara contratado pra lhe arrancar um “slogan”. Parecia que você estava com muita raiva porque sobre a terra você o fez derramar o sêmem que não poderia mais frutificar. Inútil semear numa terra infértil. Você humilhou a mãe-terra. Mas não pense que estou lhe julgando, apenas tentando dizer da minha compreensão. Raiva é raiva, irmã gêmea da impotência. Você estava tão impotente como qualquer pessoa que conhece, sente e capta, pelas pontas dos dedos-antenas, as energias do universo, mas com a consciência de que não mais poderia contar com elas, as energias. Definitivamente você estava mais abandonada de si mesma do que nunca. Entendo, de verdade, a sua depressão. A dor que provém da alma dos ossos e dos nossos centros todos inacessíveis por isso incurável. Essa era a sua tristeza. A dor do exilado. A saudade do não-sei-onde. A Melancolia metafórica, mas ao mesmo tempo muito real, que lhe esmagaria sem piedade num futuro bem próximo.

Veja, guardei essa foto sua no momento em que captava as energias.

Justine, a Melancolia carrega o medo nas letras que compõem essa palavra. Melancholia que não agradava nem no latim nem no grego desde quando nasceu e foi registrada em sua certidão já com um significado doloroso: melan(ós) ‘negro’, ‘funesto’, ‘triste’, ‘sombrio’ + cholē ‘bílis’, ‘fel’,’veneno’. Quem não tem medo disso tudo que faz o vivente carregar um fardo pesado e invisível dentro de um exílio imaginário que pune o melancólico por um crime que desconhece ter cometido? Vi você assim, Justine... desnuda literalmente, sendo carregada para o banho sem sentido, pernas que recusavam suportar o corpo, pés sem impulso cósmico para a passada necessária ao minuto seguinte.

Ontem, de novo, pensei em você quando uma amiga me falou que não estava se preocupando com mais nada. Entregava os incômodos ao universo e dizia “tudo passa”. Repetia “tudo passa”. Olhei nos olhos dela e revi os seus. Tudo realmente passa mesmo que seja por cima de nós. Cada ser – humano - tem que viver com seu próprio momento, bom ou ruim, embora alguns procurem e sejam ajudados quando tudo parece nada. Mas não adianta porque nós sabemos o que sentimos. Os outros seres apenas sentem e percebem a si e ao mundo, mas não têm ciência disso. Saber sentir. Saber que sente. Elaboramos o que vemos e sentimos pelo tal do “eu”. É a isso que chamamos de consciência.

Penso no seu criador agora. O deprimido Lars. Ele disse que nascemos com uma sentença de morte, ou seja, a consciência de que a existência tem fim e que ninguém quer ser finito. Em verdade ele usou você para dizer isso ao mundo naquele dia. Muitos não ouviram e preferiram viver na ilusão. Achei muito engraçado, porém verdadeiro, ele dizer que os psicoterapeutas, quando consultados, dizem que a ansiedade e a depressão são perigosas, mas não significam o fim do mundo. No entanto, estão enganados. Redondamente, assim como Terra e Melancolia. Claro que você fez o papel que ele quis. Interessante essa relação entre criador e criatura. Mas você contra-atacou ao tomar consciência de que lutar com o inevitável é mais desgraçado do que tudo.  Aí você entra num invejável estado de serenidade e de ajudada passa a ser ajudadora.

Foi ótima a sua mudança. Lembra de quando você se despe, simbolicamente despojando-se das vestes, e vai andando pelo bosque e deita-se sobre um pedaço significativo de rocha à beira de um rio? Perfeito momento de entrega e conexão com o universo. É isso. A serenidade nasce da aceitação e da entrega. Entenda que falo de aceitação e não de resignação. Num outro dia, distraidamente você se senta na murada dos jardins do castelo e fica balançando as pernas como uma criança que aguarda. Você olha para os longes celestes... e parece nem pensar em nada, em ser nada. Naquele momento apenas é.

Acontece então o já sabido. Tudo o que se passa naquele dia passa sobre você. É o esmagamento literal de tudo. É o fim. Bem que eu queria lhe falar sobre esse fim que não é fim, porém começo (ou recomeço). Mas não sei onde você está agora nem como está.

Vou depositar esta carta sobre uma montanha bem alta, se eu tiver coragem suficiente para escalá-la, e esperar que você a recolha e leia. Não posso ir ao correio ou enviar pela internet porque não tenho o seu endereço exato... Pode ser que as conexões todas tenham caído. Ou pode ser que as conexões todas se iniciem agora.

Antes de finalizar quero agradecer a sua companhia naqueles dias que duraram apenas duas horas para mim e para outros que realmente lhe viram e lhe sentiram. Quando eu crescer, quero ser valente como você apesar de todos os pesares. Também quero dizer que tive um ancestral com o seu nome o que nos faz ter algo em comum. Chamava-se Justinus Kerner, viveu no século XVIII, alemão, poeta, médico que se interessou por um monte de coisas que diziam ser estranhas – porque não compreendiam. Onde você estiver e se por acaso o encontrar, pergunte-lhe sobre A Vidente de Prevorst. Daqui a três dias (18) seria seu aniversário de nascimento, caso estivesse entre nós. Talvez esteja e não saibamos. A gente nunca sabe, amiga.

Um grande abraço cheio da luz que você merece por tudo o que viveu, por tudo o que ensinou.
                                                                                          Neuzamaria Kerner.

P.S. Justine é personagem do filme melancolia, dirigido por Lars Von Trier.











 

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

MINHA HOMENAGEM A VITÓRIA


VITÓRIA



Chamava-se Guanaani
e as gentes que viviam por aqui
não barganhavam moedas com suas "vergonhas".

Das miríades de pedras-colmeias emergentes das águas de sal
jorravam o mel mais doce
que o doce mel de Salomão.

Quando o desejo gritava por alimento
as mulheres lambiam o manjar abundante que escorria das pedras
- favos fálicos -
e as abelhas, complacentes,
não interrompiam o permanente estado de orgasmo
na fábrica do prazer na ilha-do-mel.

Tudo  era doçura e paz.
Quando os homens queriam mais
deixavam seus corpos boiarem nas águas e as gotas de prazer
conheciam o caminho das bocas esperantes e abertas.

Assim viviam essas gentes
contentes e livres.

Até que num entardecer,
quando o sol buscava o manto do recolhimento,
uma vela branca ao longe as tomou de assombro:
as abelhas e os zangões, em polvorosa,
cobriram de cera os corpos dos homens e das mulheres
para a inevitável batalha com o desconhecido.
Línguas de fogo e cruz invadiram os labirínticos caminhos das colmeias
e destruíram o segredo da doce produção do prazer.

Então, os deuses penalizados com tanta dor
enviaram uma branca pomba
e a instalaram para imperar soberana na Pedra da Penha.

Assim ouvi do eco dessa pedra
os ecos da história que vos narrei.
Creio nela assim como creio neste poema
e nesta Vitória onde me instalei.

                                                       Neuzamaria Kerner
                                                            08/09/2001

VITÓRIA: LINDA DE VIVER!

Não há palavras para descrever tanta beleza!... 

Sinto-me, a cada amanhecer, igual a Diego, personagem de Eduardo Galeano, no pequeno grande conto A FUNÇÃO DA ARTE 1. Ele pediu ao pai que o levasse para conhecer o mar.

"(...) depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:
- Me ajude a olhar!"

Fotos:
                             www.es.gov - Vitória

                                 www.es.gov - Teatro Carlos Gomes

          http://www.es.gov/ - Palácio do Governo


http://www.motohomes.net/ - Trem das Montanhas





http://www.gazetaonline.globo.br/ - Parque da Pedra da Cebola
http://www.es.gov.com/  - Pedra Azul
Santa Tereza - Museu Augusto Ruschi - Os beija-flores vêm...

Domingos Martins (nas montanhas) - foto NMK